quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Nós enxergamos, nós vemos

Os olhos cegos em plena luz do dia
Eles se calam, eles viram a cara
A dor paralítica que oprime
O opressor ri de nós em seu palácio
A liberdade das amarras físicas
Lapidou a nossa amarra social
E quem vem de longe não enxerga
Que não nos querem em seu quintal.

Mas nós enxergamos, nós vemos

Os afásicos periféricos, somos
Sem chances de serem ouvidos
As negras sementes
Das árvores da terra adusta
Somos dessa fauna a presa
Mutilados, quando não escondidos
Mortos,quando encontrados.

Mas nós enxergamos, nós vemos

Eles se aproximarem com seus canhões
Como se houvesse outra guerra para lutar
Que não a guerra estática, imóvel
Do pensamento lacerante
Que sangra a carne com sua foice
Longe das escolas, longe do lazer
Longe da vida, longe da dignidade
Longe dos condomínios, perto dos morros
Longe dos sorrisos, perto das mortes.

Mas nós enxergamos, nós vemos

E não há luz nessa clareira
É só um monte de alva ameaça
Às vidas disformemente negras
Que vão e que vem, que acordam cedo
Os homens e mulheres da redenção
Os rebentos dos sem-correntes
Pessoas livres escravizadas,
Seres humanos em construção

Mas nós enxergamos, nós vemos

Os atabaques soam num tom
Que as matas vibram ao seu toque
Que conversa em Bantu, em Iorubá
Que fala criolo com seus irmãos
Depois da calunga grande, o sofrimento
E todos os navios que o mar tragou
Deu sabor de lágrima às águas atlânticas
Tocou a despedida em tom de banzo
E então calou-se, do lado de cá.

Mas nós enxergamos, nós vemos























segunda-feira, 14 de setembro de 2015

A tristeza é oca

A tristeza é oca
Um profundo silêncio
Um furacão que traga
Puxa e nos derruba
Revelando em nós
O nosso pior.

Eu sou a morte.
Nasci para o fim
E do fim sou vassalo.
Sou a escolha errada encarnada
O tropeço, a mazela
A tosse dos concertos sou eu.

Meus olhos são fogos-fátuos
Perdidos sem foco
Cansados, como meu coração
Como meus pensamentos o são
Cansados da dor debaixo dos panos
Se escondendo atrás dos véus
Externando em meu peito
O vazio que sinto
Chamado de tristeza.






Te faço minha Coca Cola

Te faço minha Coca Cola
E tomo um gole
Mas sou saudável
Faço da outra um suco de frutas
E bebo Parte
Paulatinamente Digerindo
Enjoo do gosto daquela
Mudo de Sabor
Engulo o paladar da Moda
Consumindo a moça
Igual àquela da TV
Esqueço o corpo
Agora quero a que parece
Carro importado
Compro-a numa esquina
Esqueço na outra
Após uma hora de Transa
Ou de CONSUMO
Porque a que meus olhos clamam
Agora é outra
Exposta na vitrine, bela,
Já semiNua
TERMINO DE DESCASCÁ-LA
Fruta exótica
Cuspo o caroço na rua
Sem terra Fértil
Compro a que me sorriu
Semana passada
Estava na loja que gosto
Das calças jeans
E uso-a para bater
No dia-a-dia
A DESCARTO e arrumo outra
Após o desgaste
Aquele amigo que tinha
Também se foi
Arrumo outro outro dia
Em algum SITE
E se eu conseguir desconto
Compro uma dúzia
E deixo no aguardo na estante
Lá do meu quarto
Ao lado da mulher que escolhi
Pra ser meu Tênis
Pra PISAR e acompanhar
Na minha CORRIDA
Mas a escolhi pela beleza
E por ser CARA
Pois mais me importa é consumir
E ser o DONO
Do que ser e fazer feliz
Quem amo sendo quem sou
E tendo o que preciso.

quarta-feira, 9 de setembro de 2015

As miudezas que me cabem

As miudezas que me cabem
Nessa mão diminuta
Meus erros, minhas frustrações.
Nada disso serve aos homens
Nada disso serve ao mundo

Vasto mundo que me engole
Sem poesia nos dentes
Me devora
FAMINTO
Esgoelado e sem pudor
Rói meus sonhos pequenos
Minhas mudas de esperança
Num mundo melhor
Transforma tudo em mercadoria
E me vende a um alto preço
Só pra eu me endividar...

Meu tamaninho! sou uma criança
Tentando brincar de VIVER
No mundo de gente grande
Já acostumada a SOBREVIVER
Gente que acorda cedo pras ninharias
E no seu tiquinho de terra
Seu tiquinho de teto
Pensa ter tudo que precisa:
Um pedaço de pão
Uma água barrenta
Um pouco de tempo enlatado
E um sorriso falso de televisão.

Sou o cotovelo da sociedade
Um pequeno que anda só
E sou a menor história da humanidade
Aquela que vai embora fácil
Que termina abreviada sem começar
Por que sou um mundo e uma existência
Onde eu não existo nem em mim.