domingo, 24 de maio de 2015

Beijando Palavras

Peguei-me pensando em poesia
Beijando palavras, encontrei teus lábios.
Descobri que é no som das frases ditas de coração
Que os olhos brilham e encontramos,
Dentro da escuridão dos dias vazios,
A degustação dos prazeres perenes,
Que habitam as pequenas coisas.

Sim, são escuros meus olhos castanhos
Meu olhar é mais escuro ainda, cor da tua pele,
E no cansaço que o horizonte esconde
Estão meus olhos, a te procurarem
Como se houvesse um pedaço de ti nas coisas,
Não em todas elas, mas nas melhores,
As que nos fazem amar os segundos,
E não conhecem relógios, conhecem o tempo
Posto que esperam por ti na eternidade da tua presença

E quando tu passas os teus caminhos orvalham
Transparecem a memória da terra
Que lembram de ti quando nela as flores crescem,
Quando os primeiros raios de sol tocam o solo
E os vermelhos da manhã se vestem de folhas
Por quê o melhor do amanhecer é verde
Como teus olhos cor da mata,
O mesmo verde que abraça a luz do sol
E cresce no seio do calor desse abraço.

quarta-feira, 20 de maio de 2015

Gaveta de Bigigangas

Na mesma gaveta de bugigangas
Quinquilharias espalhadas
Livros e sonetos, réguas quebradas, bilhetes...
Algumas fotos entre coisas esquecidas
Um bocado de coisas desimportantes
E é lá que eu me guardo, me refugio.

Parece-me distante, ainda
Tornar-me parte da prateleira arrumada
Acima da escrivaninha, lá, pra onde olho
Sempre que procuro coisas importantes
Por que é nela que estão os melhores livros
As melhores histórias que tenho para contar
E tudo o que me é mais caro:
As fotos das pessoas que amo,
Os lembretes dos meus compromissos
Meus livros de estudo, enfim, tudo o que tenho.

Acho-me ainda morando sozinho neste corpo
Mas não moro na cabeça
E sempre parece que moro num apêndice de mim
Numa dobra minúscula do inestino
Fazendo coisinhas para parecer importante
Ensinando pequenos truques para pequenas pessoas
Servindo chás e servindo de exemplo
Para mim mesmo, exemplo do que não se deve ser.

Que orgulho! Ela me olha lá de cima e me vê menor
Como se os meus vermes fossem edifícios enormes
E eu fosse como eles, tão pequenos e tão miseráveis
Rastejando pela face da terra
Espalhando pequenos sorrisos, servindo de Puppet pra vida.

A despeito dessa gaveta me caber
Ela não cabe em mim, na minha totalidade
Sou um universo recostado numa parede
Tomando ar para continuar a expandir
Tão aceleradamente que nem sei onde vou parar
Mas se eu parar, será no topo de uma coisa qualquer
Não onde estou, num buraco de engolir vidas
Na ponta de baixo de um ice berg.


















terça-feira, 19 de maio de 2015

Quis dizer que te amava

Quis dizer que te amava
Mas as palavras não vinham
Não vieram as sílabas
Não vieram os pensamentos...

Quis dizer que te amava
Mas os sentimentos se esconderam
Tão bem que não os encontrei
Dentro de mim, em ninguém mais...

Quis dizer que te amava
Mas vi seus olhinhos famintos
Mas eram de fome mundana, fome de pão
Tua fome eu não poderia matar...

Quis dizer que te amava
Mas disse silêncio, desses sinceros
Que são o desabafo do coração
Quando vem na forma de um suspiro...

Quis dizer que te amava
Mas suspirei admitindo a derrota
Fui meu lobo ao pelejar
A luta que não se vence.

Quis dizer que te amava
E disse baixinho, pra mim mesmo
Tão baixo que nem eu escutei
E por não me ter escutado, hoje eu choro.



















quarta-feira, 13 de maio de 2015

Canção de Súplica

Arquétipo de súplica escrita
Canção motriz que me norteia
Minha lira, minha musa, minha derradeira
Tentativa de manter-me são nesta heresia.

Popular sentimento lascivo
Que a dois corpos se faz cordão umbilical
A mim foi dada a sorte da morte prematura
Da esperança em um fim triunfal.

Sou Werther, sou o vivente inebriado
Um trôpego pássaro engaiolado
Sou nada além do meu lobo atroz
Que tudo fareja, e a tudo destroi.

Paixão e poesia, assim, rebatizada
Como se eu jurasse amor eterno
Como se sofrer fosse-me um alento
Para redimir-me dos meus erros.

Olhar sereno que se foi de andada
Carregado em sonhos sem baterias
Que nem funcionam em olhos fechados
Tampouco funcionam à luz do dia
O que querias, por quais caminhos andara?
Quantos sofreres tuas mãos já suportara?

Aperta-me o peito na noite serena
Deixo a memória dos ventos sussurrar em mim
Todas as lembranças do meu relento
Todos os orvalhos caidos, enfim.

E o peito que descambou em manhã fria
Vislumbrava o beijo da pétala umedecida
Mas quis-me a morte a andar em sua companhia
Para matar-me pouco a pouco, todos os dias...

sexta-feira, 8 de maio de 2015

Silêncio de fim

Passo apressado pelo mundo:
Não sei se um dia vou ter tempo
Para ter tempo a perder.
As diligências são todas
Em tudo na vida a inquietação
E no fim, tudo acaba
Em um profundo silêncio.

quarta-feira, 6 de maio de 2015

Guerreiro-menino

Guerreiro-menino,
Fiho da mata
Criado ao som do atabaque
Passado distante
Tambor vibra
Bate no peito a saudade
Chama a ancestralidade
O chamado ecoa
O ouvido não ouve
Quem ouve é a alma
Na voz da Jurema
O passado te chama
O banzo é doído,
Seus olhos bem sabem...
A dor sem explicação
A falta essencial
Os mistérios ressoam nas árvores
Sussurram ao pé do ouvido
Seus pés querem ir sentir a maré
Ver a Lua maior
Quem sabe o espírito é liberto
No pé do Jacarandá
No tronco do Ipê?
Guerreiro-menino,
Fiho da mata
Criado ao som do atabaque
Passado distante
Tambor vibra
Bate no peito a saudade...