segunda-feira, 11 de junho de 2018

Raiz Preta, Mar profundo

Preta,
Tua raiz também é minha
Somos par da mesma planta.
Se cair, pegue em meu braço
Erga a cabeça e se levanta.

Teus passos são meus caminhos
Nossas pegadas são irmãs
Se a Kalunga tomar teu rosto
Também a mim, roubará as manhãs.

Não há mão que te sufoque
Que não roube também meu ar
Onde quer que mirem teus olhos
Lá estará o meu olhar.

Na tua voz que me ensina
No teu ouvido que me escuta
Somos dois erguendo a vida
Somos um sangrando em luta.

Se o porto é árvore de Banzo
O mar profundo ainda chora
Navega em meu barco, vem comigo
A terra preta canta: chegou a hora!

Ser teu par nessa corrida
Juntos sempre, minha missão:
Não me deixar sugar tua vida
Não ser feitor da tua opressão.

Amar, respeitar e compreender
Proteger, ser protegido
Ser meu corpo o teu escudo
Quando o seu for corrompido.

terça-feira, 5 de junho de 2018

A mente é uma armadilha

A mente é uma armadilha,
não se engane:
pontes sem muretas,
escadas sem corrimão,
sacadas sem proteção
trilhos sem caminho de volta
remédios em profusão.

É preciso vencer a disputa.
Há cor nas portas dos escritórios
No batente, talvez.
Ou é preciso pintar paredes
Nos caminhos, nos corredores.
Grafitar a vida ou perecer.

São horas infinitas, todas as oito.
O coração padece, o relógio parece
Engarrafado entre os segundos.
E o calor que se esvai
São fórmulas e planilhas, pilhas de tijolos
Tudo derramado em etílico cinco porcento.

Achar sentido na carência
Lutar contra as faltas e ausências
Sofrer sem desmoronar.
Levantar-se é preciso, uma vez mais.
Calar não é fortaleza.
Pereça, padeça, pareça
Mas deixa que o grito do peito
Seja o pedido de ajuda
Augúrio, socorro
Sua real aparência.





domingo, 3 de junho de 2018

Outros tempos

Não,
Os tempos são outros.
Passou a era das panelas vazias,
Sons metálicos pelas ruas.
Voltou o ronco do estômago
Estancado o ronco dos motores.
Carros famintos tornam a rua silêncio
Há gente que ainda clama pelo pão

E entre becos e ruelas
Escondidos em casebres ou bares do subúrbio
Frases soltas remontam à revolução.

Bastilha está morta.
Mil novessentos e dezessete também.
Os tempos são outros: tenho dito!
Cada corpo é uma guilhotina
Cada pensamento trama uma mudança
Mas revoltar-se sem armas ainda é impossível.

O grande vidente sorri diante desses dias.
O futuro está seguro, atrás de bandeiras vermelhas.
Há sangue pelas ruas, mas sempre houve.
Dessa vez não é sangue nosso
Mas o suor no rosto hoje trouxe o alento.
Um dia derramaremos justiça nesse solo.