quarta-feira, 16 de março de 2016

Livros vazios e setas sem direção

Os recados não entregues reverberam nos muros
Ressoam no chapiscado que ruborizam a minha rua.
Dentro das casas, o silêncio; dentro das pessoas, um grito de socorro encarcerado
E nenhum augúrio chega em nossos ouvidos...

Os caminhos abrem-se para mim todos os dias
Soterrado em meus destroços, desfaleço, porém
Sempre antes dos primeiros passos.
Trago os olhos cansados de olhar para o quarto e não ver você
No meu passado, os rios e tua presença são constantes
Cada um correndo em seu ritmo montanha a baixo
Cada um deixando rastro por onde passa...
Suas lágrimas foram meu funeral em folhas
Como se você fosse a árvore de todos os meus frutos
E todo o sabor da minha vida fossem suas mão maduras sobre mim.

Não houve estrela branca ou bruxuleante
Quando os perfumes noturnos tornaram-se memória
O som das crianças brincando doíam nos ouvidos
Lá fora a vida seguia; por dentro eu permanecia estático.

O temor que meus olhos não enxergassem a luz bendita
Mostrou-se a fagulha que na alvorada desponta no horizonte:
Cresceu com o tempo, queimando as plantas da sacada
Matou o homem íntegro que habitava em mim.

Não pude te dizer adeus sem ter os olhos molhados
Pois vi na sua dor a minha dor, e no seu choro, a minha tortura...
Estive ao seu lado quando a maré encheu
Vi nosso barco partir para as terras além do alcance
O nosso caminho sem volta, a busca derradeira
Forjei em meu peito um castelo de açúcar
E foi minha taquicardia a nossa dissolução.
Inflamei o corpo e o esvaziei como se faz a um prédio em chamas
A alma fugidia, arredia e indomável livrou-se da carne
Encontrou os piores pensamentos e amotinou-se
Contra a pureza advinda das chamas...
Eu sou o pecado preso ao seu belo corpo
E sou o doce dos seus lábios que adoçam os chás.

De manhã, todo raio de luz tem seu nome
Todo galo que canta declama a nossa poesia
E todo o mel da terra tem a cor dos seus olhos.


Sobre a rua de todas as casas dessa cidade
Permeando espaços impenetráveis como o pensamento
O murmúrio vai espalhando-se, dissolvendo-se
Feito uma pitada de sal num caldeirão de água.
Faço-o pequeno como sou ante a imensidão do tempo
Tudo passa sobre essas pedras justapostas
Tudo passa sobre o calçamento bem feito da rua dessas casas
Nós haveremos de passar em breve um pela história do outro
Como passam os transeuntes sem olhar para trás
Mas ainda nos arrastamos feito água barrenta, densa
Carregando o peso dos nossos pensamentos sobre nós.

(Onde foi parar meu sono? E o meu cansaço, cadê?
Durmo deveras pouco à noite;penso demais de dia;
E escalo as montanhas das minhas aspirações mundanas
Sempre levando você no colo.
E quando o dia teima comigo e nasce novamente feito um rebento revolto
Vejo que é hora de recomeçar.
Mas onde é o fim de um sentimento eterno?
"- Anda, levanta-te!", digo a mim mesmo,
E de sobressalto sou o silêncio misericordioso dos cemitérios
E meus olhos são o arrebol depois de um dia azul.)

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